2006-07-23

POEMA MEU V
(Senta-te aqui a meu lado)

Disseste-me de olhos quase em mágoa
Que não querias percorrer o meu caminho.
Compreendi-te e respondi que sim.

Olhei o vento da memória,
A secura dos dias sem tempo,
O calor das noites em vidraça,
A tristeza da profunda alegria,
O contentamento das lágrimas das aves.

No deserto preenchido da memória,
Vi-me trespassado pelos cactos…

Oh quem me dera voar no acolchoado das horas,
Em direcção aos meus avós,
Ao símbolo perfeito da perfeição do tempo,
Sem me sangrar o viço da derrota.

Compreendi-te, porque eu próprio,
Não quero repisar este caminho.

Quero planar na leveza do condor
E ver ao longe sempre um horizonte
De linhas imperfeitas.
Não creio na rectidão das rectas
Nem na beleza do Sol que incendeia
A seara loira do meu coração.
Tudo isso é incompleto,
Porque incompleta é a vida.
A vida é linha recta imperfeita,
E perfeito é o passado dos avós
E o futuro para além do meu futuro.

Por isso tens razão: não queiras, simplesmente,
Repetir o nulo dos meus passos.

Senta-te aqui a meu lado
E em uníssono respiremos as estrelas.

Copyright, José Silva